sexta-feira, 29 de abril de 2011

Narrativa Transmídia

A revolução da indústria do entretenimento em todas as mídias

Texto: Paulo Roberto Montanaro

Imagem: Bíblias Transmídia

Desde que me conheço por gente, sempre há um termo tecnológico na moda e citado aos quatro ventos. Veio o vídeo-cassete 4 cabeças, o CD, a internet, o ICQ, o DVD, o
Orkut, a TV Digital, a Banda Larga, o Twitter, dentre tantos outros. Também vieram a Multimídia que definia o fantástico CD-ROM e a Hipermídia com a internet e a navegação não-linear. Cada qual destes inventos ou apetrechos hi-tec causaram muitas transformações no cotidiano, inicialmente de poucas pessoas e depois foramse alastrando e se popularizando até o ponto onde qualquer um precisa saber do que se trata para não ser chamado de jurássico.

O termo Transmídia, ou narrativa transmidiática (original do inglês transmedia storytelling) é, no meio audiovisual, o termo do momento, graças ao ótimo livro "Cultura de Convergência", de Henry Jenkins. E não é para menos. Algumas das maiores experiências de universo expandido da indústria do entretenimento desenharam alguns dos projetos mais audaciosos e bem sucedidos de divulgação e diálogo com o seu público exatamente trabalhando com estratégias transmidiáticas. Mas, afinal, o que é Transmídia?

O termo é usado para definir um campo que estuda possibilidades de construção de universos, ou mesmo multi-versos, a partir das diferentes interfaces e em torno de um conteúdo narrativo. Neste caso, não se pensa produtos diferentes a partir de uma única matriz, mas sim um único produto a partir das mais variadas formas de comunicação midiáticas. É, desta forma, um fenômeno que se utiliza das mais variadas mídias, interfaces e dispositivos para atingir o seu público com vários elementos narrativos que compõe um todo.

Para ficar mais fácil de se compreender, podemos imaginar um exemplo hipotético. Imagem um filme de ficção científica, onde o autor constrói um universo rico em detalhes, com planetas, civilações, tecnologias, criaturas e tudo mais que uma boa história do gênero pode ter. O longa-metragem, geralmente composto por duas horas centradas em uma linha narrativa com personagens específicos, jornada do herói e tudo mais não dá conta de mostrar toda a mitologia criada e embasada para torna-la crível. O filme se completa, mas não esgota o ambiente criado.

É possível, assim, estabelecer uma série de TV, por exemplo, que serveria como prelúdio daquela trama narrada no filme. Talvez 23 episódios se aprofundando mais na origem de cada um dos personagens. Mesmo assim, há literalmente um universo inteiro para ser desvendado e outras temporadas podem ser criadas a partir do cânone e a série pode se estender até o ponto em que o filme se inicia.

Mesmo assim, há muito o que se explorar. Cria-se então um jogo de videogame para os consoles de última geração, onde o personagem principal é da geração posterior à trama do longa-metragem, algo como um herdeiro de poderes, virtudes ou prestígio. Mas ao contrário do seu predecessor, ele não é o protagonista e sim o grande vilão da estória. Resta ao jogador, de posse de todas as habilidades que foram estabelecidas anteriormente, seja pelo filme, seja pela série, conseguir alcançar um novo objetivo, controlando um ou mais novos protagonistas.

Paralelamente a tudo isso, do outro lado deste pedaço do universo, uma raça desconhecida enfrenta problemas que são resultado dos eventos ocorridos no momento diegético do filme. Cria-se então um segundo longa-metragem que mostra os personagens do primeiro descobrindo tais problemas e tendo que ir até resolve-los, encontrando já a situação bastante avançada. Cabe a uma série de animação, mais curta e com outros protagonistas, exibida na TV, contar o que aconteceu antes dos personagens originais chegarem.

E tudo isso recheado de websódios (ou episódios seriados para internet, geralmente mais curtos que os padrões da televisão), que apresentam pequenos acontecimentos que influenciam na trama principal, ou mesmo jogos de realidade alternativa pela internet, onde o jogador assume o papel de um personagem secundário e passa por situações pararelas ao das tramas do cinema e da TV, histórias em quadrinhos vislumbrando um futuro onde as coisas não acontecem do jeito esperado, um romance abordando a sociedade séculos antes dos acontecimentos da sinopse original, um site corporativo fictício da empresa criada para a trama, dentre tantas outras ramificações possíveis e imagináveis.

Some a tudo isso a participação ativa dos fãs, que acabam, por conta própria e sem nenhum incentivo externo, produzindo conteúdos e compartilhando com outras pessoas que também acompanham a saga. Blogs, fanfics, teorias, debates, fóruns, resenhas, críticas, etc são constantemente alimentados por novas idéias processadas por milhares ou mesmo milhões de mentes pelo mundo. Algumas vezes, criam-se novas mídias tão interessantes quanto às originais, com personagens bem construídos, situações fantásticas e um diálogo com o cânone muito bem costurado. A participação do público é fundamental e parte necessária em uma estratégia transmídia.

Perceba que em nenhum momento, uma mídia simplesmente adaptou a outra. Não há, neste exemplo, a mesma história sendo contada de novo em uma outra linguagem, como é normal acontecer no mundo de entretenimento onde até brinquedos de parques de diversão são adaptados para as telas. Cada mídia se comporta de forma diferente, contando partes de uma narrativa muito mais, cada qual com suas particularidades, compondo um universo e cercando o fã por todos os lados. E cada uma destas partes pode ser auto-suficiente, para que não seja necessário consumir todas as demais para que se possa aproveitar desta. Não é necessário ver a série-prelúdio para se assistir o filme, nem ler as HQs para se jogar o game. Por outro lado, aquele que consegue acessar todas estas informações terá um experiência mais completa daquele universo.

Espero ter introduzido o tema de forma bastante clara, ainda que, no final, virou um emaranhado de coisas que até eu me perdi. Mas espero que logo esse assunto seja desmembrado para que possamos estudar alguns casos, tais como o das franquias Matrix, Star Wars, Lost e Batman. Aguardem novos posts onde esses temas serão abordados à luz do termo da moda, a transmídia.


Referências Bibliográficas

JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. São Paulo: Aleph, 2008.

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