
Lost é composto pela dualidade. Oposições não faltam ao longo dos últimos cinco anos, desde o início, com o embate entre o bondoso doutor Jack e o golpista politicamente incorreto Sawyer, passando pelos sobreviventes e os Outros, fé e ciência, Ben e Widmore, Jack (de novo) e Locke, ilha e cargueiro e, somando-se a essa lista, Jacob e o seu nêmesis de nome desconhecido, mas que muita gente já convencionou chamar de Esaú. Mas a maior de todas estas antagonias não está no roteiro, mas sim em nós que acompanhos a série quase que como seguidores de Jacob (ainda que alguns possam questioná-lo de vez em quando). Lost tem fãs completamente diferentes entre si. Uns adoram as relações pessoais, romances, amizades e desenvolvimentos sociais que a série propicia, já que juntou em um mesmo momento, forçadamente, personagens de tão diferentes origens e trajetórias, que acabaram sendo obrigados a conviver e a sobreviver juntos, causando brigas, amizades, desconfortos, relações amorosas, relações de ódio... enfim, relações humanas, sobretudo. Outros são fãs da mitologia construida pela série, que bebe nas mais diversas fontes para criar a sua própria. Parafraseando uma grande frase de Paulo Emílio Salles Gomes, grande estudioso do cinema nacional, nada em Lost é referência, pois tudo o é. Ou seja, o seriado se utiliza de tantas fontes que acaba por se tornar único exatamente porque não se parece com nada e, ao mesmo tempo, é tudo. Não basta saber somente sobre mitologia egípsia, ou sobre o cristianismo, ou sobre a mitologia grega, porque tudo se mistura lá se transformando em algo novo e uniforme. É essa mitologia que faz com que estes fãs percam suas noites de sono atrás de imagens de deuses que se pareçam com uma estátua, ou buscando saber o que significa cada frase em latin dita por Richard, o homem que não envelhece. São fãs do mistério, do suspense, da ficção científica, que ficam imaginando onde esta ilha está, se dentro da terra, se em outro planeta, se em outra dimensão ou plano espiritual, ou se existe mesmo. Posso estar enganado em afirmar que nunca na história mundial algo conseguiu ser a representação viva e inconteste da Babilônia como Lost está se tornando há alguns anos. Se a criação de J.J. Abrams segue alguns dos paradigmas criados por Matrix ao dialogar com o espectador pensante, se difundindo nos mais diversos veículos para ampliar o seu universo e se tornando um genuíno exemplo do que se convencionou chamar de crossmedia, acrescentou algo novo ao alimentar um multiverso ainda maior: o do seu público.
Esta quinta temporada foi sintomática quanto a tudo isso. Trouxe novos elementos à trama, alguns que causaram a fúria de alguns membros da comunidade lostiana, outros que a fizeram aumentar. Tratou de um tema sempre complicado, como as viagens no tempo e todas as suas implicações, mostrou nuances nunca vistas antes de cada um dos personagens, inverteu valores e atribuições e fechou como a série se tornou especialista em fazer: trazendo mais perguntas do que respostas. Alguns se perguntam se isso não é uma coisa ruim, visto que estamos a só desesseis episódios do final da saga, mas eu duvido. Temos mais de 9 meses para gestar teorias e hipóteses, as quais certamente cairão por terra a cada cena da última temporada, como tem acontecido sistematicamente após cada fim de temporada.
Enfim, Carlton Cuse e Damon Lindelof mostraram mais uma vez que sabem onde estão levando a série. O clarão final desta temporada é a grande metáfora deles para nos mostrarem o quanto sabemos sobre a verdade que está por trás da ilha. Mais do que nunca, as expeculações são livres e, certamente, estarão erradas. Só precisamos aguardar, debater, discutir que olho é aquele no meio do tapete fiado por Jacob e o porque ele tocou cada um dos nossos personagens principais em momentos distintos de suas vidas. Mas eu ainda tenho certeza que Rose e Bernard morreram juntos dentro de uma caverna para serem encontrados em 2004. No mais, não sei de nada. E... que bom!