quarta-feira, 19 de outubro de 2011

[ Pesquisa ] A Narrativa Transmídia e a busca de uma nova linguagem audiovisual para EaD

A educação a distância, ou EaD, tem se difundido em todo o mundo já há algum tempo. No Brasil, ainda que relativamente tarde, a tendência não poderia ser diferente. Hoje, as maiores universidades do país, tal como outras tantas em países da Europa e da América do Norte, utilizam-se da modalidade de ensino e aprendizagem baseado em interações entre educadores e educandos, cada qual em espaço e tempo diferentes, por meio de uma interface de mediação. Se há algum tempo a comunicação escrita e impressa via correspondência era soberana na EaD, hoje a grande ferramenta que cumpre esse papel é o meio digital, sobretudo a internet. Ambientes virtuais de aprendizagem são bastante comuns nos sistemas atuais, sejam eles públicos, como o já bastante estabelecido Programa Universidade Aberta do Brasil – UAB, sejam privados, como o de várias universidades particulares do país. Contudo, as grandes mudanças de paradigma não estão ocorrendo somente na mídia onde a comunicação entre os envolvidos se dá.

Há, de fato, atores e elementos novos sendo inseridos e desenvolvidos, estabelecendo uma nova linguagem de comunicação. É nesse contexto que as mídias audiovisuais se encaixam de forma bastante contundente, ainda que a evolução e o desenvolvimento estético e lingüístico de sua produção estejam em uma fase intermediária entre as primeiras experiências e o estabelecimento daquilo que a define. O conceito de videoaulas, tal como visto em programas educativos de televisão, ou mesmo de filmes didáticos, como aqueles produzidos pelo INCE de Edgar Roquette-Pinto e Humberto Mauro, estabeleceu parâmetros importantes no que tange o audiovisual com fins educativos. Entretanto, a narratividade e a linearidade destes conteúdos é um grande reflexo de como se entende a educação presencial e, deste modo, tais materiais tendem a manter um padrão sistemático em relação ao ensino em sala de aula. Muda-se a interface, mas a linguagem permanece a mesma. Todavia, em um momento onde acontece uma nova revolução tecnológica pautada pela convergência de mídias, esses elementos já não são suficientes para contemplar as novas demandas educacionais dos espaços virtuais.

Chega então o momento de dar o passo adiante na construção colaborativa desse novo conceito de audiovisual, buscando atingir a essência do que se convencionou chamar de transmidialidade. Há, assim, uma nova demanda para conteúdos não-lineares e de construção interativa; elementos que buscam uma intervenção efetiva e ativa do educando e dos demais envolvidos, tais como professores e tutores; e um universo expandido, com conteúdos presentes nos mais diversos espaços, cada qual como parte de um todo, planejado e articulado para funcionar organicamente. Isto posto, o meio digital mostra não ser uma sala de aula tradicional e, deste modo, não deve se limitar a emular um espaço similar. A proposta transmídia deve contemplar, sobretudo, as mais variadas possibilidades de relacionamento entre o educando, educadores e o conhecimento. Assim, universidades e educadores devem trabalhar com seus conteúdos por meio não só de vídeos expositivos para televisão ou mesmo computadores, mas também jogos eletrônicos, conteúdos para dispositivos móveis, animações e ambientes interativos com texto, imagem e som.

Explorar espaços diferentes abre possibilidades educativas bastante interessantes, dialogando com uma nova geração de educandos que estão em contato constantemente com as mais diversas tecnologias disponíveis em um mercado cada vez mais mutante. É, portanto, fundamental e inevitável que todos os envolvidos no processo de criação e estabelecimento das linguagens audiovisuais para educação e, mais diretamente, para educação a distância, estejam prontos para romper com os limites impostos por um formato específico e estabelecido e, desta forma, alcance o diálogo com o educando ao máximo das potencialidades que somente a convergência midiática pôde trazer.

Bibliografia

ANDERSON, C. A cauda longa: do mercado de massa para o mercado de nicho. 3 ed. Editora Campus/Elsevier. Rio de Janeiro.

ANDRADE, L. Multimídia para web. Disponível em: http://ies.ufscar.br/leoandrade. Acesso em: 28 jan. 2009.

BELDA, F, R., Um modelo estrutural de conteúdos educativos para educação digital interativa. 2009. Tese (Doutorado). Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2009.

CORDEIRO, L. Z. Elaboração de material videográfico: percursos possíveis In: CORRÊA, J. Educação a distância: orientações metodológicas, Porto Alegre; Artmed, 2007.

COSTA, C. Educação, imagem e mídias. Editora Cortez. São Paulo, 2005.

GOSCIOLA, V. Roteiro para as novas mídias: do game à TV interativa. Editora Senac. São Paulo, 2003.

JENKINS, H. Cultura da convergência. 2ª Ed. São Paulo: Aleph, 2009.

KELLNER, D. A Cultura da Mídia. Bauru: EDUSC, 2001.

LEVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1994.

PFROMM NETTO, S. Telas que ensinam: mídia e aprendizagem do cinema ao computador. 2 ed. Campinas, SP: Alínea, 2001.


* Este texto foi concebido inicialmente como proposta de comunicação individual para o XV Encontro Nacional da Sociedade Brasileira de Cinema e Audiovisual - SOCINE e foi apresentado em Setembro de 2011 no evento ocorrido no Rio de janeiro.


quarta-feira, 7 de setembro de 2011

[ Review ] Invasão do Mundo - Batalha de Los Angeles

Invasão de extraterrestres é e, acredito eu, sempre será um dos carros-chefe da ficção científica, principalmente nas grandes produções do cinema norte-americano. O fascínio que o tema causa já foi tratado aqui no review da primeira temporada de Falling Skies (que você pode conferir clicando AQUI). Em Invasão do Mundo - Batalha de Los Angeles, acompanhamos uma história contada por um ponto de vista bastante interessante, sendo guiados por um grupo de fuzileiros navais americanos no ápice de uma guerra contra invasores. O resultado não é ruim, longe disso, mas tem alguns problemas de execução, que podem ou não incomodar o público que o filme busca atingir. Tudo depende, como diriam os físicos, do ponto de vista. Afinal, não é segredo para ninguém tudo o que uma produção como esta quer mostrar. Basta olhar o cartaz ao lado para entender quem é, de fato, o grande salvador da pátria da produção.

O grupo de fuzileiros que centralizam as atenções no longa do diretor Jonathan Liebesman, cujo personagem central é o segundo-sargento Nantz, é composto dos mais diversos elementos, cada qual com o seu arquétipo mais do que estabelecido, indo do cara com problemas psicológicos e está em tratamento para voltar a manipular armas e é chamado às pressas para um combate violento, à mulher que trabalha com questões técnicas e que, por acaso, está inserida na linha de frente da guerra. Tais personagens são apresentados rapidamente no início do filme, depois da cena inicial, em uma espécie de flashback que antecede aquilo que já estamos cientes do que vai acontecer. Contudo, esta apresentação parece ser um tanto que apressada para algo que pretende humaniza-los na busca de uma empatia com o público; ou desnecessária, já que só prepara terreno para duas horas de tiroteio e quebra-pau. Durante o filme, você não está ligando para o cara que vai casar ou se o virgem do grupo vai acabar morrendo antes de encontrar o amor nos braços de uma mulher. Em meio a tanta correria, cortes rápidos e sangue, o espectador sequer identifica um ou outro, ou se consegue diferencia-los, não tem tempo para pensar quem era esse cara lá no início do filme. O foco, neste desenvolvimento de personagens, está de fato no protagonista, e mesmo assim é bastante raso e cheio de clichês, daqueles ruins, já que é mais do que óbvio que uma hora ou outra ele vai se confrontar com o irmão de um de seus antigos soldados que morreu outrora e com todos os fantasmas de seu passado.

O filme é totalmente centrado nesta galera. Assim, em momento algum se sabe sobre o que anda acontecendo pelo mundo afora, ou mesmo em outros pontos de Los Angeles. As únicas informações que o espectador recebe são dadas por aparelhos de rádio ou televisão, espalhados pelo cenário. Curioso que, em meio a um apocalipse repleto de destruição, os canais continuam transmitindo e todos os locais devastados permanecem com energia elétrica e com TVs ligadas e sintonizadas exatamente nestas emissoras. No Brasil, a energia seria a primeira coisa que iria para o espaço nessas horas. Enfim, seguindo a proposta de nos colocar dentro da ação, como parte daquele grupo, o diretor faz a escolha que já nem é tão original ou arriscada como outrora, de trabalhar com câmera na mão. Ainda que o cinegrafista não esteja inserido na miss-en-scene, como em Cloverfield, por exemplo, a sensação de quem assiste é exatamente a mesma de ser mais um dos elementos que tentam, a todo custo, escapar do fogo inimigo. Esta escassez de informações colabora bastante com as surpresas a cada nova esquina, já que não sabemos se a guerra está acabando, se está terminando, e quem está ganhando. Algo muito parecido com o que cada um deles sente na busca pela sobrevivência e do cumprimento da missão.

No final das contas, Invasão do Mundo - Batalha de Los Angeles foi pensado para um público específico. Identifica, portanto, todos os pontos fundamentais necessários à narrativa e os explora o máximo possível. A grandiosidade de cada um dos confrontos parece ser ponto central na idéia da produção e os efeitos especiais foram pensados milimetricamente para serem satisfatórios sem ultrapassar limites orçamentários (ou mesmo de criatividade da equipe de produção). Há quem reclame do patrotismo exacerbado e do heroísmo americano, há quem reclame da história manjada, ou mesmo do didatismo de cenas e relações que já vimos tantas vezes. A verdade é que aquele que procurou o filme estava buscando exatamente estes elementos para se divertir. E, neste caso, o sucesso é absoluto. Quem estava procurando por um Band of Brothers, certamente não deve ter lido o nome do diretor no cartaz, nem que haveria alienígenas na história. Portanto, o filme cumpre o que promete, em todos os sentidos. Não é um clássico pós-moderno do cinema de vanguarda, longe disso, e certamente não ficará na memória por muito tempo. Diverte, entretem, tensiona, e acaba. Foi feito pra isso. E vale a pena.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

[ Preview ] Death Valley

Depois de lançar o controverso Teen Wolf, a MTV americana se compromete a colocar mais uma série com temática sobrenatural no ar, desta vez com uma pegada um pouco mais adulta. Ainda que corajosa, a série se mostra ainda instável em sua proposta, tendo um roteiro bastante fraco, diálogos medianos e situações até aqui bem fracas para algo pretende ser chamado de comédia de terror. No episódio de abertura, um punhado de situações que se pretendem engraçadas, mas que acabam por ser constrangedoras. Mas há uma certa esperança para a série, pois há possibilidades de crescimento dos personagens, da própria estrutura narrativa e das situações toscas que parecem ser o mote do show.

Death Valley apresenta um grupo de policiais, o Undead Task Force, responsável por combater o surgimento de criaturas que aterrorizam sua vizinhança: zumbis, vampiros e lobisomens. Absurdamente, estes seres existem, sabe-se lá porque, mas não tomaram conta (ainda) do mundo e são só indivíduos à margem da sociedade que devem ser combatidos. A proposta, que surge do absurdo de reunir tudo isso numa panela só, é interessante, já que a intenção é realmente explorar as situações ridículas que podem resultar de um grupo bizarro de tiras combatendo essas forças do mal. O problema é a execução. No final do episódio de abertura, tem-se uma sensação de que preciosos minutos da vida foram perdidos, já que não há nada que faça rir de verdade, nem mesmo que cause aquela sensação de ser engraçado ou de que, em um dia mais alegre, seria motivo para um leve sorriso. E não há nada mais frustrante em uma comédia do que não fazer rir.

Com uma proposta de linguagem que lembra bastante os programas policiais mais conhecidos nos Estados Unidos, sendo o mais famoso deles Cops - que no Brasil tem algo parecido em Polícia 24 Horas, na Band - o dia-a-dia destes policiais é acompanhado por uma equipe de TV, o Channel 5. Os técnicos e a parafernalha são, portanto, parte da diegese e não é difícil que personagens interajam com o cara que segura o boom ou com a câmera, em primeira pessoa. É a estética do mocumentário, ou falso documentário. Também há situações que satirizam as consagradas séries policiais tradicionais, como CSI, por exemplo, no que tange investigação e resolução de casos. Contudo, a salada feita com tudo isso não dá liga. As piadas não funcionam, o timing do elenco ainda é bastante pobre e a execução parece apressada, juntando um monte de trechos que não fazem sentido quando unidos. Ainda que seja uma característica destes programas que acompanham casos isolados, não funciona neste primeiro episódio, já que os personagens não são apresentados de um modo que se entenda o porque e como estão ali, nem suas diferenças mais básicas.

Todavia, ainda há um certo crédito. A proposta é muito boa e abre possibilidades enormes para casos e situações. As gags devem ser melhor trabalhadas a medida que o público vá conhecendo os personagens e suas particularidades. A maquiagem é boa, ainda que a caracterização das criaturas ainda esteja meio confusa, e os efeitos especiais não comprometem. As cenas dos próximos episódios, exibidas ao final do season premiere, dão uma sensação que a série tende a melhorar. Tomara, porque não se pode perder uma boa idéia tão rápido assim. Principalmente quando se aborda as criaturas mais legais do universo pop.

sábado, 27 de agosto de 2011

[ Review ] Planeta dos Macacos - A Origem

A primeira questão para além da elaborada trama de O Planeta dos Macacos - A Origem que nos envolve ao final da projeção é bastante clara: será que, em algum momento, vamos parar de nos impressionar com a evoluação da tecnologia que permite a construção de coisas, cenários, universos e, principalmente, criaturas vivas, por meio da computação gráfica? Se em O Senhor dos Anéis já nos derretíamos com a fantástica participação de Gollum, a sensação foi ainda mais intensa com a nova leitura de King Kong, ambos de Peter Jackson. Se puxarmos ainda mais pela memória, poderemos relembrar que tudo isso começa mesmo para o grande público lá nos anos 1990, com o primeiro Jurassic Park, de Steven Spielberg, arrasando quarteirões. E, mesmo assim, neste novo trabalho, o fascínio que se iniciara já nas fotos de divulgação e depois nos primeiros trailers também é transportado para as quase duas horas do filme. Então, volto à questão? Há um limite? Há algum ponto onde não haverá mais como dar o passo seguinte? Talvez quando não soubermos mais diferenciar personagens humanos reais dos criados pelo computador... até lá, que bom que temos a oportunidade de acompanhar cada passo desta evolução.

Evolução é mesmo o tema deste filme. Não necessariamente no sentido de progressão, ou de melhoria, ainda que os dois conceitos possam se confundir o tempo todo para nós e para os personagens. A trama acompanha Cesar, símio dotado de uma modificação genética que lhe permite aumento significativo e progressivo da capacidade mental, desde o seu nascimento até seu amadurecimento como o grande líder que, sabemos todos, mais tarde se tornará uma lenda entre a civilização que substituirá a humana no futuro. Tais habilidades lhe são conferidas quando sua mãe é cobaia de testes de uma droga, que mais tarde se revela um vírus, desenvolvido e pesquisado como avanço no tratamento do Mal de Alzeimer. Há os personagens humanos na trama, como em toda a franquia, mas o foco do filme os relega a coadjuvantes do grande protagonista, algo já visto no citado King Kong. James Franco está bem como Will Rodman, mas seu drama com seu pai, que possui a doença e é o motor de sua pesquisa, e com a sua namorada, acabam nem ofuscando aquilo que nos interessa de fato. Sua presença, portanto, se faz necessária, mas não é pré-requisito para uma aguardada sequência, já que Cesar e sua história têm vida própria e são motores de tudo o que está por vir.

Contudo, o filme tem alguns pontos que podem incomodar alguns. As feições de Cesar são tão realisticamente humanizadas que não deixam de causar aquela estranheza, de ao mesmo tempo que não há defeitos, parecer falso. Os demais símios, todavia, são mais realistas visualmente e me agradaram mais. Ainda assim, o comportamento de todos eles é talvez o mais esquisito, já que carregam todos os clichês do ser humano. A ponto de, ao fim da cena onde primatas e seres humanos guerreiam na Ponte Golden Gate, termos o ritual de despedida mais repetido da história do cinema norte-americano. Na minha visão, adquirir inteligência comparável a de humanos não significa obter também seus costumes, sua cultura e seu comportamento social. Obviamente, Cesar cresceu assistindo televisão e acompanhando a rotina de homens e mulheres, muito mais do que a de seus iguais, e, assim, estes seriam suas referências. Mas não acredito que tal influência seja determinante para sua essência. Afinal, ter a mesma capacidade mental não siginifica ser a mesma coisa. Se golfinhos fossem tão inteligentes quanto cães, não latiriam, nem correriam atrás de carros (ou fariam?). Por definição, ele não é humano, e este ponto específico acaba se tornando o motor de sua rebelião contra até mesmo as pessoas que o amam. Também achei curioso como alguns macacos que não não foram afetados pelo tal vírus, quando escapam, já assumem o mesmo comportamento dos demais. Será que a inteligência é contagiosa? Ou a revolução o seria?

Detalhes a parte, Planeta dos Macacos - A Origem é um grande filme. A narrativa é muito bem construída e nada parece ser por acaso no desenvolvimento dos sentimentos e princípios de Cesar. Sua relação com os demais macacos também é muito bem concebida. Neste caso, os clichês são bem vindos, com a constituição de seu grupo. O sábio, o brutamontes, o arquirrival... todos compondo um grupo heterogênio, mas complementar em suas habilidades, sentimentos e motivações e, deste modo, acabam se transformando em algo que chamaríamos de generais no exército angariado pelo grande líder. Outros símios também tem seus momentos, mostrando uma capacidade muito grande do diretor Rupert Wyatt em construção de personagens, visto que não é fácil trabalhar vários sujeitos sem diálogos. Aqui, a tal tecnologia que foi tratada no início deste texto é fundamental, mais do que para um belo espetáculo visual, para dar personalidade a tantos indivíduos diferentes. Expressões faciais, sinais corporais e tempo de comunicação fazem destes, na minha opinião, os mais completos personagens digitais já criados no cinema. E aqui vale uma menção especial ao trabalho maravilhoso de Andy Serkis, fundamental para dar vida a Cesar, assim como o foi com Gollum e King Kong. Está se especializando nesse tipo de trabalho e deve fazer escola, já que não adianta ter a tecnologia mais avançada se não houver material humano competente para explorar suas potencialidades.

Certamente, um dos melhores filmes da temporada. A franquia parecia esgotada quando o remake de Tim Burton fracassou em 2001, não por ser ruim, longe disso, mas por não despertar no público o mesmo fascínio das versões anteriores. Se, em 1968, o primeiro Planeta dos Macacos, com Charlton Heston, se mostrou algo para além de entretenimento, com forte crítica social, em 2011, exatamente reiniciando a franquia de um outro ponto de vista, utilizando de uma outra estética e uma linguagem própria, este novo filme faz jus ao legado que carrega, ao mesmo tempo que tem alma própria, se permitindo ir para além do que já foi feito, mesmo que cada referência seja muito bem vinda. E talvez o mais bacana seja torcer pelo apocalipse, porque sabemos o que o futuro reserva para a raça humana, e mesmo assim, torcemos pela revolução. Curioso, não?

domingo, 21 de agosto de 2011

[ Jogo On-Line ] Angry Birds

Ok, ok... não é bem uma novidade. Afinal, muita gente já conhece esse joguinho que é uma febre, principalmente entre os usuários do iPhone. Contudo, vale conferir essa versão para internet. O pequeno detalhe é que só funciona para o brower da Google, o Chrome. E, mesmo que você não tenha ele instalado no seu computador, vale a pena baixar só para poder explodir alguns porquinhos.


Para você que esteve fora do Planeta Terra nos últimos anos, Angry Birds é um jogo com uma mecênica bastante simples onde, por meio de um estilingue, você deve arremessar os pássaros mais pirados do mundo à porquinhos. O objetivo? Destruí-los! Simples assim.

Para acessar o jogo (lembrando mais uma vez, utilizando o Google Chrome), clique no link abaixo:

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

[ Review ] Saint Seiya: The Lost Canvas - 2ª Temporada

Antes de falar desta segunda temporada, faço aqui uma consideração: da mesma forma que a Flashstar Filmes teve que fazer, esta resenha da segunda temporada acompanha o nome oficial da série aqui no Brasil: Saint Seiya: The Lost Canvas. Tal mudança foi uma exigência do estúdio que produz o anime no Japão. Portanto, ainda que, para nós, brasileiros, tudo isso ainda se trate de uma espécie de prelúdio do bom e velho Cavaleiros do Zodíaco, é justo que possamos estar em consonância com a distribuição no país, respeitando os apontamentos de quem produz. A primeira temporada, da qual já tratei aqui no blog, permanece com o nome clássico, mas acredito que agora, até o fim, se mantenha o nome inteiro original.

Isto posto, posso agora tratar desta nova temporada, ainda que produtos japoneses, sobretudo animes, tem uma lógica de temporadas um pouco diferente dos americanos. Com 13 episódios lançados no Japão diretamente em DVD e em Blu-Ray, assim como a primeira temporada, acompanhamos a jornada de Tenma, cavaleiro de bronze que defende a constelação de Pégaso, acompanhado por Yuzuriha, de Grou e Yato, de Unicórnio, até o Castelo de Hades. Nesta jornada, encontram muitos inimigos poderosos, e também muitos aliados bastante importantes nessa caminhada. Dentre eles, Manigold, de Câncer e El Cid, de Capricórnio, ambos cavaleiros de ouro bastante poderosos. Também entendemos um pouco melhor a relação entre Sage, o Grande Mestre do Santuário e Hakurei, seu irmão gêmeo e antigo cavaleiro de Altar. A trama, assim, se desenvolve não só centrada na missão do trio liderado por Tenma, protagonista da história, mas também e principalmente na jornada indivisual de cada um destes personagens.

Neste ponto, coloca-se então algo bastante latente em todas as produções deste universo: o aprofundamento de cada um dos personagens, focalizando o seu momento atual e explicando cada uma de suas ações e pensamentos por meio de suas experiências, referências e toda a sua bagagem anterior. A intempestividade de Manigold, característica também encontrada em Máscara da Morte (cavaleiro de Câncer dos tempos atuais) é bastante instigante quando o personagem está em busca de justiça de uma maneira bastante particular. Da mesma forma, o ser perfeccionista de El Cid se mostra na sua busca pelo golpe ideal. Fazendo novamente um paralelo com a série clássica, como ambos os referentes destes cavaleiros tomaram papéis de antagonismo (coincidentemente, enfrentando Shiryu), não se pode mostrar como cada um deles entende o que é ser um cavaleiro de Athena. O mesmo pode ser notado em Albafica de Peixes na primeira temporada, já que Afrodite também foi visto somente como um vilão. Deste modo, pode-se ver algo aqui que não fora visto anteriormente: a importância dos cavaleiros de ouro na hierarquia dos protetores da deusa. Se na séria antiga parecia que somente 5 dos 88 cavaleiros defendiam verdadeiramente o juramento e a razão de existirem, aqui todos tem a sua parcela em uma grande guerra. Vimos parte da devoção dos cavaleiros de ouro somente na Saga de Hades dos tempos modernos, mas a série clássica ficou marcada exatamente pela chamada Batalha das 12 Casas, onde os dourados eram, de fato, os inimigos a serem vencidos.

Algo que chama a atenção e que talvez possa incomodar um pouco é forma como a narrativa se desenvolve para os demais personagens. Não há grandes batalhas entre cavaleiros de prata ou bronze contra espectros "normais". Quando estes aparecem, são ambos dizimados pelo poder infinito do inimigo, tanto de um lado como do outro. A trama entre El Cid e seus aprendizes poderia render ótimos momentos onde eles pudessem participar ativamente da guerra santa. Chegaram a ser apresentados, cada um com suas personalidades bem iniciadas, mas tudo se vai quando todos são destruidos com um único ataque de uma grande divindade. O mesmo ocorreu na primeira temporada com os postulantes a cavaleiro treinados por Hasgard, de Touro. Afinal, haveria espaço para nos apegarmos a mais personagens que, teoricamente, seriam fracos, mas que cresceriam e se tornariam grandes ídolos, como na série clássica, onde Seiya era, de fato, protagonista, mas outros tantos personagens também recebiam atenção e acabavam roubando preferência do público. Como exemplo, quantos tinham como cavaleiro preferido Hyoga ou Ikki? Cada qual, à sua maneira, tendo um carisma e uma tragetória muito interessante, dava corpo a um grupo de cavaleiros que buscava um objetivo comum.

Em The Lost Canvas, o papel de protagonismo momentâneo cabe a estes cavaleiros de ouro citados anteriormente, o que é bom, mas como o ciclo de cada um acaba com a sua redenção e morte, não há tempo para se torcer para que eles cheguem ao final junto aos demais. Ao mesmo tempo, Yato jamais atingiu o carisma e o desenvolvimento próprio para que se torça realmente por ele. Yuzuriha é ainda pior, já que ninguém liga que ela tenha conquistado sua armadura de Grou (?), nem que tenham sido treinada por Hakurei, ao lado de Shion. Ambos, de fato, assumem papel de ajudantes (no pior sentido) do protagonista, aqueles que ninguém liga se estão vivos ou mortos. Até porque, graças a informações que temos dos tempos atuais, sabemos que nenhum deles sobrevive ao final desta Guerra Santa, já que somente Dokko e Shion sobram. Sinto falta, portanto, de algo que possa nos remeter a algumas das imagens clássicas de nossa infância que justificavam lembrarmos dos Cavaleiros do Zodiaco. No final das contas, a escolha da produtora japonesa em não permitir a tradução aqui no Brasil acabou vindo a calhar. Não faz mais sentido pensar em CDZ quando, no final das contas, somente um pode ser entendido como protagonista. Os demais estão lá para facilitar o seu caminho, não para chegarem junto com ele ao final.

Contudo, tudo isso talvez seja sinal de um certo saudosismo, ou uma estranha nostaugia. Entendo que a sensação que tive lá com meus 10, 11 anos de idade ao assistir cada um dos cavaleiros de bronze serem massacrados para, depois de tudo, vencerem com apenas um golpe jamais retornará. E, abrindo os olhos para este novo momento, posso vislumbrar coisas que não me importavam naquele momento, onde The Lost Canvas supera CDZ, tais como a trama principal, que é muito melhor articulada entre os ambientes e personagens, e as batalhas, que mesmo mantendo sempre aquela mesma expressão "ele parou meu golpe mais poderoso com apenas uma das mãos", abre espaço para ótimas possibilidades narrativas. Não poderia imaginar a solução dada para o desfecho da batalha entre El Cid e Oneiros, com a ajuda da flecha de Sagitário lançada por Sísifo. Frustação mesmo foi o prometido embate no final da temporada, com a marcha dos cavaleiros até o Castelo de Hades, com todos eles voltando pra casa sem nem ao menos encontrar ninguém. Neste ponto, senti o mesmo que Kardia, o cavaleiro de Escorpião, que parece ser um dos personagens centrais da próxima temporada, juntamente com Dégel, de Aquário.

Como não li o mangá, nem mesmo fui atrás dos resumos para saber como a saga continua (para não perder a sensação se surpresa a cada episódio do anime), não sei se conheceremos os cavaleiros de Dragão, Cisne, Andrômeda ou Fênix desta era. Também não sei se outros poderão se mostrar importantes a ponto de nos importarmos com eles. Mas espero que a série, que se mostra bastante positiva em muitos aspectos, como tramas, cenários e relações entre personagens, possa buscar um pouco mais do carisma que sempre foi o ponto mais forte da série antiga.

Imagens por: http://www.cavzodiaco.com.br/

terça-feira, 9 de agosto de 2011

[ Review ] Falling Skies - 1ª Temporada

ETs e invasões alienígenas não são nenhuma novidade no mundo do entretenimento, certo? Orson Welles conseguiu, segundo relatos, criar um certo pânico quando, lá em 1938, com um programa de rádio adaptando a obra de H. G. Wells - Guerra dos Mundos - em formato de noticiário falso. Saiba mais sobre essa passagem da história do cinema em um artigo especial do Omelete clicando AQUI. Depois disso (antes também), não faltam exemplos na literatura, no cinema, na televisão e nos videogames de histórias que se baseiam na chegada, quase nunca pacífica, de vida inteligente ao nosso planeta. De homenzinhos verdes de Marte até robôs gigantescos de Cybertron, de Wookies a Predadores, o universo inteiro tem interesse em dominar a Terra, ou pelo menos abusar um pouquinho dela, começando geralmente pelos Estados Unidos da América (de preferência, no Dia da Independência americana, como nos ensinou Roland Emmerich).

Neste contexto, Steven Spielberg também tem suas contribuições. Do pacífico ser de olhos grandes de ET - O Extraterrestre até a adaptação do mesmo Guerra dos Mundos, o cineasta sempre foi referência no mundo nerd quando o assunto eram os seres de outro planeta. Portanto, não é por acaso que assina essa nova produção que também se propõe a explorar o tema. O que leva, certamente, a pergunta: Porque ele faria isso? O que mais esse sub-gênero pode oferecer que não esteja sendo repetido por todos os cantos com produções questionáveis para o cinema como Invasão do Mundo: Batalha de Los Angeles ou Skyline? O que o formato de seriado pode querer depois do relativo fracasso da nova versão de V - A Batalha Final? Falling Skies é a resposta para todas essas perguntas. Talvez não uma resposta maravilhosa, e para alguns uma péssima resposta, mas mesmo assim, uma nova idéia.

Não que o seriado, que acaba de encerrar a sua primeira temporada de apenas 10 episódios nos States, seja maravilhosamente original. A sensação de quem assiste e acompanha o dia-a-dia de um grupo de sobreviventes de uma invasão alienígena é de que já viu aquilo algumas vezes. Mas, ao não se focar nas grandiosas batalhas, e sim nas relações entre personagens, a produção que é encabeçada por Spielberg se destaca e, no final das contas, vale a pena ser acompanhada. Tanto que já está renovada para mais uma temporada e a tendência é de se manter firme, com um público fiel e já bastante estabelecido.

Resumindo, a trama se concentra alguns meses depois de uma invasão que praticamente dizimou a população do nosso planeta. Os ETs chegaram, desligaram tudo o que era eletrônico por aqui, o que atingiu todas as nossas possibilidades de defesa, e venceram. Sequestraram pré-adolescentes e mataram o resto. Há poucos sobreviventes vivendo em pequenas comunidades, algumas das quais compostas do que sobrou das forças armadas e civis. O foco da narrativa está no grupo nomeado como a 2ª de Massachusetts, e está centrada na família de Tom Mason, ex-professor de História e segundo no comando do agrupamento, abaixo somente do Capitão Weaver, um militar aposentado. Na tentativa diária de sobreviver e de manter as pessoas a salvo, eles enfrentam com poucos recursos as ameaças daqueles que chamaram de Mechs (robôs fortemente armados) e de Skitters (criaturas alienígenas de seis pernas e uma aparência monstruosa). A série não demora a mostrar que há outra espécia alienígena dentre os invasores e que parecem, de fato, serem os líderes da invasão; e que as crianças sequestradas estão sendo escravizadas com uma espécie de parasita que controla seu centro nervoso.

Como dito anteriormente, o clima do seriado não é o mesmo visto em grandes produções como Independence Day ou Guerra dos Mundos. A invasão não está acontecendo; ela já aconteceu. Não há mais como salvar o planeta da destruição. Tudo isso já passou. O apocalipse já se deu. Portanto, não se deve olhar para a série esperando grandes batalhas aéreas, mas sim um clima de mundo desolado e de sobrevivência. E, neste aspecto, Falling Skies está muito mais próximo de The Walking Dead ou de produções focadas em zumbis. Parece estranho, mas a ambientação de que o grande inimigo, muito mais poderoso e já dominante, é a mesma. E, neste momento, tudo o que se entende como modo de vida está comprometido. A raça humana passa a ser acuada e sua estrutura social é profundamente modificada.

Curioso ver como produtos de entretenimento americanos sempre retratam uma sociedade devastada sobrevivendo e conseguindo progredir a partir de conceitos semelhantes a uma idéia comunista de divisão de trabalho e compartilhamento de recursos. Fosse a mesma lógica de dominadores e dominados do capitalismo, focos de resistência à processos de extermínio jamais conseguiriam prosperar. E, desta forma, pode-se comparar a 2ª Mass com qualquer grupo de sobreviventes dos filmes de George Romero. Coincidência, ou não, as crianças que são tomadas pelos invasores se parecem muito com zumbis recém-transformados, mantendo suas feições e seus traços físicos, mas totalmente privados das emoções humanas de outrora. Tudo isso, contudo, com uma roupagem sci-fi muito bem construída, com efeitos especiais coerentes e um desenvolvimento da história bastante interessante. Até porque apenas 10 episódios por temporada permitem que não haja necessidade da chamada "barriga", ou, em outras palavras, de enrolação. O grupo todo de personagens centrais tem relevância e permitem um aprofundamento cada vez mais acentuado, o que abre espaço para tantas outras temporadas que vierem.

Curioso também que, neste mesmo paralelo com filmes e séries de zumbis, Falling Skies muitas vezes abdica de mostrar os ETs o tempo todo. Há episódios que eles sequer dão as caras. Muitas vezes, o inimigo de outro mundo não é nada comparado ao cara que está ao seu lado e que supostamente luta pelos mesmos objetivos. Não foram poucos os momentos onde sobreviventes tiveram que enfrentar ou se defender de outros humanos na busca pelo dia seguinte, pelo pão ou pela sua família. Com essa idéia de focar na construção de relações humanas pós-fim do mundo é que a série se destaca dentre tantas outras produções com a mesma temática. Isso pode agradar muitos, mas também desagrada tantos outros

Como balanço final da primeira temporada, Falling Skies se mostra interessante e apresenta um grande potencial de ser realmente uma série memorável. Os personagens ainda não são tão cativantes a ponto de o espectador se importar verdadeiramente com eles, o que é uma falha grande quando a produção se foca exatamente neste ponto. Contudo, o desenrolar de novas temporadas tende a nos aproximar da vida e da intimidade de cada um deles, os humanizando e, assim, tornando-os caros. O final do último episódio abre uma brecha curiosa sobre como o protagonista irá seguir adiante e, mesmo o season finale não sendo bombástico (em todos os sentidos), cria uma boa expectativa para o que tem por vir. Tomara que estes ETs sejam menos burros que tantos outros e saibam instalar anti-virus nos seus computadores e tomem direitinho as suas vacinas contra bactérias terrestres. Ninguém consegue atravessar o universo e destruir uma civilização sem ser esperto o bastante para se preparar para coisas assim...

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Humberto Mauro, as Brasilianas, o pensamento industrial e a história do cinema brasileiro

Edgar Roquette-Pinto, grande entusiasta da utilização dos meios radiofônicos e cinematográficos com fins educativos, e Gustavo Capanema, então ministro da educação e da saúde do governo Getúlio Vargas, unem esforços a educadores, higienistas e intelectuais em uma proposta de utilizar a mensagem e o aparato cinematográfico para o engrandecimento do homem através da educação. Há também, nesse momento, uma idéia muito objetiva de fortalecer o nacionalismo desenvolvimentista, tão aclamado por Getúlio Vargas como diretriz de seu governo. Neste contexto, funda-se então, em 1936, o INCE – Instituto Nacional de Cinema Educativo, com gestão do próprio Edgar Roquette-Pinto. Ligado ao Ministério da Educação e Saúde, o instituto tem como seu principal realizador o cineasta Humberto Mauro, que aceita o convite do próprio diretor do instituto e, durante a sua história, será o maior realizados dos mais de 350 filmes produzidos pelo INCE.

Os dez primeiros anos do instituto foram os mais produtivos, tendo a parceria entre Roquette-Pinto e Humberto Mauro uma de suas maiores virtudes. Afinal, Roquette-Pinto tinha prestígio junto ao ministro Capanema, Mauro já era um cineasta reconhecido no meio e o INCE, ainda que com recursos escassos, tinha aparatos técnicos suficientes para filmagem, revelação, montagem e sonorização dos filmes que produzia, além de poder adaptar filmes estrangeiros para o contexto nacional. Foram feitos, assim, filmes sobre assuntos diversos, sempre pelo viés educativo. Eventos cívicos, pesquisas científicas, tratamentos médicos e retrato biográfico de personagens ilustres brasileiros estão entre os temas mais queridos do INCE neste primeiro momento.

Com a aposentadoria de Roquette-Pinto em 1947, o INCE, aos poucos, vai perdendo o seu caráter estritamente educativo por motivos diversos, dentre eles o político. Humberto Mauro acaba tendo mais liberdade criativa e temática e isso se reflete nos filmes produzidos a partir de 1948. O mundo rural, quase inexistente na fase anterior, é bastante trabalhado e querido por Mauro na mesma medida em que o INCE vai perdendo o seu motivo de ser. É grande o movimento no meio cinematográfico para o incentivo estatal ao cinema de ficção longa-metragem e o instituto, em uma política de produção de filmes ficcionais de curta-metragem acaba relegado a segundo plano pelo estado getuliano e pelos próprios cineastas e pensadores do cinema da época.

O método de produção independente e artesanal que Mauro emprega nos seus filmes também se contrapõe ao método industrial defendido como única chance do cinema nacional existir. Neste contexto, Humberto Mauro produz, em Minas Gerais, uma série de curta-metragens com temática rural chamados Brasilianas, dentre outros. Mais tarde, exatamente pelos motivos pelos quais foi preterido, Humberto Mauro é elevado a fundador do Cinema Novo. Isto posto, proponho o estudo desta série de curta-metragens não só na questão da linguagem utilizada ou das referências de Humberto Mauro e seu cinema, mas também trazendo essa análise para os contextos político e histórico do cinema nacional.

Questões levantadas na bibliografia-base consultada mostram ainda outros aspectos, tais como a existência – ou não – de um certo desprezo a respeito da produção de curtas-metragens por Mauro enquanto funcionário público pela historiografia clássica do cinema brasileiro; a influência destes filmes na ideologia do vindouro Cinema Novo; e a importância desta produção dentro do cinema brasileiro como um todo. A reflexão busca, portanto, analisar as influências do cinema educativo de Humberto Mauro na linguagem, na temática e nos modos de produção do cinema das décadas de 1950 e 1960.

Leia mais sobre Humberto Mauro clicando AQUI.



Bibliografia:

AUTRAN, Arthur. O pensamento industrial cinematográfico brasileiro, Tese de Doutorado, Instituto de Artes - UNICAMP, 283 pp, 2004.

PFROMM NETTO, Samuel. Telas que ensinam: mídia e aprendizagem do cinema ao computador. 2 ed. Campinas, SP: Alínea, 2001.

SCHVARZMAN, Sheila. Humberto Mauro e as imagens do Brasil. São Paulo: Ed. UNESP, 2004.

VIANY, Alex. Introdução ao cinema brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Revan, 1993.


Texto originalmente escrito para o XII Encontro Nacional da Sociedade Brasileira de Cinema e Audiovisual - SOCINE, ocorrido em outubro de 2008 em Brasília-DF.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

[ Review ] Mortal Kombat Legacy - 1ª Temporada

Equilíbrio. Esse é talvez o ponto essencial para qualquer produto seriado. E talvez seja o maior dentre os pontos negativos da websérie Mortal Kombat Legacy, do diretor Kevin Tancharoen. Lançada neste ano de 2011, a série feita exclusivamente para a internet busca explorar um formato ainda muito pouco utilizado pelas grandes empresas. Contendo 9 episódios de aproximadamente 10 minutos cada, a experiência busca detalhar a origem de personagens já bastante conhecidos do seu público-alvo, abordando alguns pontos ainda ocultos na mitologia criada nos jogos, famosos desde os anos 1990, e fazendo a releitura de outros.

O primeiro problema é o erro estratégico da Warner, dona dos direitos da franquia. Releituras e diferenças entre histórias contadas em mídias distintas nunca foram um problema em si. Afinal, cada mídia tem sua própria linguagem e adaptações em todos os sentidos devem ser feitas para que o produto possa funcionar. A questão é o momento. A websérie foi lançada exatamente no mesmo momento em que o novo jogo estava entrando nas prateleiras, recontando a história base da franquia, em uma espécie de reboot que, ao mesmo tempo, abre uma nova linha narrativa. E mais ou menos o que foi feito com outra grande franquia, só que no cinema: Star Trek. E o modo de história propriamente dito do jogo é o mais detalhado possível. A série, por sua vez, tomou outra direção e conta a mesma trama com diferenças muito grandes em questões básicas, como a relação entre Kitana e Mileena, por exemplo. Ou seja, em tempos onde a estratégia da Narrativa Transmídia abre possibilidades de expansão do universo em uma estrutura multiplataforma, a escolha feita com Mortal Kombat é de criar algo paralelo e não-canônico, o que desagradou grande parte dos fãs mais fervorosos.

Outra questão que também prejudicou bastante a proposta é que, exatamente por ser uma experiência ainda pouco explorada, também não arrebanha muitos investimentos. Pensando em uma franquia de criação de universos paralelos, batalhas épicas, fantasia e elementos fantásticos, questões técnicas de efeitos especiais, direção de arte, fotografia e mesmo interpretação pesam demais. O resultado são episódios visualmente muito pobres, com ambientes mal produzidos, figurinos próximos de cosplays ruins e efeitos especiais bastante limitados. No episódio dedicado a Scorpion e Sub-Zero, por exemplo, ainda que o ambiente esteja bastante adequado com toda a neve e o espaço aberto, o figurino parece uma adaptação de roupas de moleton! Já o elenco reune atores e atrizes que muitas vezes só podem ser identificados quando são explicitamente chamados pelos nomes conhecidos. Mesmo assim, temos um Jax baixinho, uma Sonya Blade bem mais velha, Kano sem barba, Baraka parecendo um orc porcamente maquiado e um Shang Tsung tão raquítico que dá muita dó. Enfim, nenhuma credibilidade é passada pelas áreas mais importantes da produção.

Ainda com todos esses problemas, o que mais incomoda mesmo nestes poucos episódios é a falta de equilíbrio citado no começo deste texto. Cada episódio, mesmo todos eles sendo dirigidos pela mesma pessoa, tem estruturas estética, narrativa e linguística completamente diferentes entre si. Enquanto os primeiros episódios se pautam num certo realismo, os seguintes seguem por outras vias. Ainda que espaços diferentes exijam tratamentos diferentes (um universo policial é diferente de uma dimensão calcada na magia), as bases da construção são alteradas a cada novo ato. Se no momento que trata da história das ninjas assassinas há inserções de animação (ainda que sejam alguns dos pontos mais interessantes dos episódios), esse recurso é totalmente ignorado em outros momentos, sendo considerado, de fato, só uma experiência abandonada. Ou seja, não há uma proposta visual orgânica, onde o espectador pode se sentir confortável. A série perde exatamente o equilíbrio ultrapassando a linha entre experimentação e um emaranhado de cenas e histórias sem nenhuma proposta. E que isso fique muito claro: buscar alternativas narrativas sempre é bem-vindo, desde que essa proposta seja coerente em si.

Ainda assim, essa primeira temporada não é totalmente ruim ou descartável. Algumas coreografias de lutas são bastante interessantes e empolgantes. O episódio sobre Johnny Cage é um bom exemplo disso. Mas é no episódio final, com Sektor e Cyrax que temos momentos realmente muito bons de pancadaria, sem firulas, onde a intensidade de cada porrada é impactante. A leitura de um momento de Raiden assim que chega à Terra também é bem legal, explorando uma sitação sombria e que despertaria, inicialmente, pouco interesse, para falar como seria se alguém aparecesse aqui se dizendo Deus do Raio e do Trovão e protetor do Reino da Terra. Também citei anteriormente que as soluções em animação estilizada são muito interessantes e poderiam ser muito mais utilizadas ao longo da série, mas com menos frequência por episódio do que foi feito. E, claro, conhecer um pouco mais de histórias laterais da mitologia de Mortal Kombat é sempre muito interessante.

Creio que há muito o que a Warner possa evoluir nessa proposta. O que todos podemos sonhar seria com algo muito mais grandioso do que apresentado até aqui. Uma série adulta, no estilo HBO, como Game of Thrones, ou mesmo como Spartacus, da Starz, seria muito mais expressivo, teria certamente um público cativo e poderia, aí sim, explorar a violência inerente à essência de Mortal Kombat, sem abrir mãos de boas histórias de origem que pudessem culminar no tão aclamado torneio, que poderia inclusive ser um ótimo longa-metragem lançado nas salas de cinema. Mas enquanto isso, esperemos que a Warner e a NetherRealm tenham aprendido com os (muitos) erros cometidos até aqui e consigam estruturar melhor seu conteúdo para as mais diversas plataformas e para a vindoura segunda temporada. Não que uma série ruim abale o ótimo jogo lançado este ano, longe disso, mas se souberem como fazer, Mortal Kombat pode ser ainda maior. E com sangue, por favor.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

[ Review ] Game of Thrones - 1ª Temporada

O universo medieval e a fantasia sempre foram fonte de grandes histórias épicas e criações extraordinárias. J.R.R. Tolkien e seu universo já consagrado em tantas obras (desde a clássica trilogia O Senhor dos Anéis até outras obras que se ambientam neste mesmo universo, como O Hobbit - a caminho do cinema - e O Silmarillion, dentre tantas outras) é talvez o maior expoente deste nicho, mas está muito longe de ser o único. C.S. Lewis e a grande obra As Crônicas de Nárnia (que não obteve, no cinema, o mesmo sucesso da trilogia dirigida por Peter Jackson, mas que também se tornou bastante conhecida), Christopher Paolini e a saga que se iniciou em Eragon (que também não foi feliz na sua adaptação para as telonas) e Licia Troisi e suas Crônicas do Mundo Emerso são outros dos muitos exemplos onde mitos e criaturas fantásticas se encontram com espadas, reinos, cavaleiros e armaduras. Game of Thrones, série da HBO baseada na série de livros As Crônicas de Gelo e Fogo (ou originalmente A Song of Ice and Fire) de George R. R. Martin, também se propõe a explorar essa espécie de gênero, ou subgênero, ao mesmo tempo que consegue estabelecer uma identidade própria, distanciando-se assim das outras obras citadas anteriormente, ao mesmo tempo que mantém uma sensação de familiaridade em seu público.

Basicamente, a primeira temporada segue alguns arcos bastante distintos, mas todos girando em torno no poder, representado pela monarquia que comanda os Sete Reinos de Westeros. Acompanhamos as famílias Stark, Lannister, Baratheon e Targaryen, além do povo Dothraki em suas caminhadas, que se cruzam no passado e no presente em torno do tão desejado Trono de Ferro. Conhecemos espaços como o Porto Real, capital dos Sete Reinos; A Muralha, última proteção ao norte; Winterfell, terra dos senhores do norte; e tantas outras cidades e povoados que nos mostram a extensão e a diversidade deste universo criado por Martin. Nomes de personagens e lugares parecem bastante complicados de se aprender no início, mas naturalmente, ao longo destes 10 primeiros episódios, o espectador passa a conviver com os eles e reconhece-los. O desenvolvimento de cada um deles se dá de forma muito interessante e cada um tem sua jornada pessoal bem explorada. Ainda que seja um mundo complexa, a série é bastante feliz ao trazer o público para si e para os dramas pessoais vividos naquelas terras. E a belíssima abertura é um espetáculo à parte ao montar, quase que em maquete, os espaços que vamos conhecendo ao longo do percurso. Não é necessário sequer aquelas grandes paisagens exploradas por Peter Jackson, por exemplo, para se ter a dimensão dos Sete Reinos de Westeros. Ponto para os criadores que resolveram essa questão de forma muito criativa e não menos fascinante.

Além dos personagens, a trama também se desenvolve com uma facilidade quase que natural. Tudo se encadeia de modo bastante orgânico, funcionando em seus contextos sem parecer forçado. A separação de cada família também garante que, mesmo havendo tantos membros em cada Casa, os indivíduos tem, cada qual, a sua personalidade única, suas motivações e seus caminhos diferenciados. Ainda que há um certo protagonismo da família Stark, não há lados bom e ruim. Há influências familiares, claro, nas ações de cada personagem, mas há também aquilo que os torna únicos. O então alardeado jogo dos tronos se dá exatamente pela diversidade de intenções e consequências das ações de cada um. E exatamente por essa característica, não se pode eleger o herói e o vilão da história desde já, com tantas nuances entre todos eles ocorrendo o tempo todo.

Cada episódio deixa claro, por meio de suas escolhas, que não se deve esperar que, ao final de sei-lá-quantas temporadas, um ou outro seja eleito o rei e viva feliz para sempre. O penúltimo episódio é bastante corajoso ao mostrar que não há receio de se inverter papéis arquetípicos entre todos os personagens. Assim, é aqui que a história consegue estabelecer sua identidade. A jornada do herói, bastante conhecida deste e de tantos outros universos, não pode ser prevista. Ao mesmo tempo que sabemos quem será aquele pelo qual torceremos em histórias tradicionais, e que no fundo sabemos que será ele a salvar o dia, em Game of Thrones nada disto fica claro, aumentando então a tensão de que tudo pode acontecer.

Esta primeira temporada, contudo, deixou alguns (poucos) fãs um tanto quanto decepcionados pela falta de batalhas grandiosas e grandes embates entre as Casas antagonistas. Pode-se dizer que, no cinema, o climax destes combates é bastante necessário. Em O Senhor dos Anéis, por exemplo, cada um dos filmes exigia uma batalha épica por filme. No entanto, em um seriado que pode durar alguns anos e tantas horas mais, é fundamental que se guarde esse momentos para situações que realmente devam ficar marcadas como grandiosas. Até porque a batalha seguinte, nestes casos, precisa ser, necessariamente, maior, mais sangrenta, mais violenta, com mais gente lutando (e morrendo). Isso seria insanamente difícil de se fazer toda temporada. Assim, gostei bastante das escolhas da produção em explorar a personalidade de cada personagem e os desdobramentos de suas ações nesta temporada de apresentação.

Os efeitos especiais estão absolutamente apropriados, sem nenhum exagero, trazendo ainda mais realismo à trama, mesmo esta tendo elementos tão sobrenaturais e fantásticos como uma boa história como essa pede. A direção de arte é muito competente na sua proposta, não devendo nada para nenhuma superprodução do cinema, trazendo referências de tantas culturas diferentes, mas mantendo aquilo que nos é tão familiar. O elenco também mostra muita segurança nas nuances da construção de personagens tão complexos. Nomes como Sean Bean (que parece ter nascido para atuar nesse tipo de produção, lembrando muitas vezes sua competente atuação no primeiro SDA), Lena Headey (depois do épico 300 e de sua participação no seriado de O Exterminador do Futuro como Sarah Connor, em uma reconstrução muito interessante de uma personagem bastante cultuada e que, em muitos momentos, salvou a série) e Mark Addy trazem ainda mais respeito à série. Mais uma vez, o esmero da HBO se reflete na qualidade estética e narrativa de sua produção. Definitivamente, Game of Thrones é recomendação máxima, principalmente em um ano de estréias bastante medianas.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

[ Review ] Guia de Sobrevivência a Zumbis

Ok, ok... não se vê muitos reviews sobre livros aqui no PIS, por pura falta de tempo mesmo, mas espero poder fazer mais postagens sobre essa mídia, que continua sendo uma das maiores fontes de ótimas estórias. Então, como obra que inaugura a sessão de críticas literárias no blog, escolhi Guia de Sobrevivência a Zumbis, de Max Brooks.

Basicamente, o título da obra é auto-explicativo e não há muito o que se acrescentar sobre o teor do livro. Em pouco mais de três centenas de páginas muito bem escritas e ilustradas, Brooks faz um apanhado de tudo o que se sabe sobre os mortos-vivos para que qualquer um esteja preparado para quando houver uma insurreição destas criaturas horrendas. São levantados dados sobre o que faz um ser humano se reanimar depois da morte, quais as melhores armas e estratégias de combate, opções de fuga e de vida pós-apocalíptica, além de todos os mais importantes relatos históricos de casos importantes que envolviam os chamados zumbis.

Em um estilo que, no audiovisual, poderia ser chamado de mocumentário (aqueles documentários sobre temas fictícios, mas que são produzidos com todos os elementos para se mostrarem reais), o autor trabalha com uma série de questões existentes em tantos guias de sobrevivência já escritos para explicitar uma série de paranóias que governos, exércitos e pessoas comuns tem quando pensam no fim dos tempos tal como conhecemos. Se os norte-americanos levam muito a sério todas as estratégias de sobrevivência pós-guerras nucleares, por exemplo, Brooks brinca com o tema, levando os mesmos pontos para um mundo fantasioso para, aí sim, mostrar o quão ridículas tais dicas podem ser.

Afinal, que nerd nunca imaginou como seria a sua vida a partir de um evento como esse, onde os zumbis tomassem conta da Terra? Quantas vezes o tema não foi explorado na literatura (Eu Sou a Lenda, de Richard Matteson, Orgulho e Preconceito e Zumbis, de Seth Grahame-Smith e Guerra Mundial Z, do próprio Max Brooks são bons exemplos), no cinema (a cinegrafia inteira de Romero é o maior expoente de um sub-gênero do terror bastante extenso), nas HQs, na televisão (em ambos os casos, The Walking Dead é atualmente a obra mais conhecida) e nas mais diferentes mídias? E porque o tema continua tão instigante? O que torna o zumbi uma criatura diferente das demais?

Talvez a grande diferença não seja exatamente o morto-vivo em si, mas sim a sensação de o quão primitivas as pessoas podem ser ao sobreviverem ao apocalipse. Afinal, a grande sacada dos filmes de zumbis não é nada além da relação das pessoas que sobrevivem aos ataques. O seu inimigo não é a criatura que quer devorar seu cérebro. É o cara que luta ao seu lado e o que ele poderia fazer no momento de desespero. Afinal, ser civilizado e altruísta é questão de conveniência. E Brooks sabe trabalhar muito bem com o tema neste livro.
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