Hurley não tem malícia. E em um sentido bem amplo. Dentre todos os personagens principais de Lost, e mesmo se comparado à grande maioria de todos os que passarem pela Ilha, ele se mostrou aquele que menos se preocupou em mostrar ser alguém que não era. Seus segredos – quem não os tem? – não escondiam vergonhas ou um passado problemático, mas culpa. Afinal, ele tinha a plena certeza que, ao ganhar mais de U$116 milhões na loteria, tinha trazido o azar e a desgraça para todos aqueles que o cercavam. E isso, talvez, porque o grande e maior defeito do Dude era não ter certeza de sua própria sanidade mental, visto que em um passado recente, ele se convencera de que o Instituto Mental Santa Monica era o lugar dele.
Sua trajetória abarcou todos os percalços possíveis. Teve seus problemas de família, algo recorrente dentre os personagens da série. Seu pai, figura de admiração de quando era criança, fugiu sem sequer se despedir, dando uma desculpa de viagem a trabalho. Já com o físico alterado por uma disfunção alimentar, Hurley se sente culpado pela queda de um deck onde estava, evento onde algumas pessoas faleceram e, em choque, ele acaba se internando no instituto para doentes mentais citado anteriormente. Lá, acaba conhecendo Dave, figura que mais tarde ele descobriria ser uma criação de sua mente. Dave, mais tarde, na Ilha, também voltaria para por em questionamento a sanidade de Hurley novamente, mas como da primeira vez, ele consegue se libertar desse fantasma.
Ao conseguir sair do instituto, Hurley se sente recuperado, volta a trabalhar como atendente em lanchonete, e lá sofre com o preconceito e o abuso de autoridade de seu patrão, o que contribui para diminuir ainda mais sua auto-estima. Seu peso já lhe incomodava e isso parecia sempre ser motivo de chacota para os demais, principalmente aquele que pagava seu salário. Tudo isso promete mudar quando ele ganha na loteria, utilizando os famigerados números 4, 8, 15, 16, 23, 42, que mais tarde vamos descobrir significar muito mais do que uma sequência de sorte. Se torna milionário, coisas ruins começam a acontecer em sua volta e ele entende que não foi uma coisa boa ter ganho tanto dinheiro. Ainda assim, ao ter profissionais cuidando de suas finanças, se torna ainda mais rico. Em pouco tempo, é dono da fábrica de caixas onde descobrimos ser o mesmo lugar onde Locke trabalhava e, principalmente, se torna dono da lanchonete de onde tinha saído. A maldição do dinheiro vai deteriorando ainda mais a auto-confiança dele e, com o retorno de seu pai e a tentativa desmascarada de provar que não havia nada de errado com sua sorte arrebentam com o equilíbrio mental que ele conquistara e sua obsessão era encontrar os motivos dessa maldição. Essa busca o leva ao vôo 815, no qual sofre o acidente que o faz cair na Ilha, e até mesmo por esse desastre, ele se sente responsável.
Dentro da Ilha, acaba sendo um dos únicos sobreviventes a se relacionar bem com todos os lados do grupo. Não tem conflitos ou problemas com a liderança assumida por Jack, nem com os apelidos lhe conferidos por Sawyer – que foram muitos – nem com ninguém. Ironicamente, era sempre a voz mais consciente dentro do grupo, buscando encontrar em cada detalhe um motivo para eles não se destruírem pelo desespero. Criou um campo de golfe, construiu uma forte amizade com Charlie, encontrou em Libby, por poucos dias, o amor que jamais teve coragem de buscar fora da Ilha, venceu seus medos e traumas, salvou a vida de seus companheiros quando encontrou a Kombi Dharma e sempre superou as expectativas de seus colegas quanto a ele. Lá, assim como tantos outros, se tornou alguém, parte de um todo, condição que ele jamais conquistara antes de cair na Ilha. E se todos sempre apontaram que Locke havia sido o que mais havia se adaptado àquele ambiente, Hurley passou dificuldades no início, principalmente com alimentação, mas logo conseguiu encontrar seu espaço e seu próprio modo de vida.
Quando consegue sair da Ilha, sua segurança, aos poucos, vai minando. Longe de seus amigos, longe de seu ambiente, novamente 150 milhões mais rico, sua auto-confiança vai se decompondo. Ver Charlie Pace, depois de morto, foi a gota d'agua para que seu interior explodisse novamente, o fazendo implorar para voltar para o único lugar do planeta onde se sentia seguro: o Instituto Santa Monica. Suas visões e seus fantasmas não o abandonam e, mais uma vez, a culpa o atormenta. Desta vez, ele se sente culpado de ter deixado para trás seus companheiros, de ter mentido fora da Ilha para o mundo e de não ter feito nada para ajudar aqueles que estavam perdidos. Ainda que não quisesse voltar, uma visita de Jacob foi fundamental para que ele refizesse aquele caminho em busca de respostas e de paz.
Hugo Reyes é um cara simples. Um parceiro para todos os momentos, que apesar de todos os traumas e culpas, foi a voz inocente da razão. Sua ligação com os números acabou se tornando o maior de todos os seus segredos, principalmente para ele mesmo. Um homem atormentado, mas que nunca deixou de partilhar com os outros a sua bondade gigantesca, ou o seu Chocolate Apollo. Não tem remorsos, ou mágoas, e se os tem, logo se permite livrar deles. Foi assim que retomou a sua relação com seu pai e com todos os outros que lhe fizeram algum tipo de mal. Seu dom parece algo muito mais importante do que uma doença mental, como ele mesmo acredita,e pode ser fundamental no desfecho da saga dos sobreviventes do voo 815. Ao contrário, a importância do Dude nos sorrisos e na vida de cada um que esteve ao seu lado já é real e definitiva.
Pitaco da Karen
Hurley é o boa praça! Uma figura que todos, de alguma forma, conhecemos, pois nos faz lembrar de tudo o que é bom em um amigo. Dono de tiradas impagáveis (quem vai esquecer a tentativa de escrever o roteiro de Star Wars com melhorias..) ele eleva o astral dos losties em qualquer situação.
Tanto que é fácil esquecer do passado também complicado que inclui abandono do pai e uma inexplicável maldição nas costas.
De coadjuvante cômico a mediador foi um passo. E aposto que o boa gente tem ainda uma conexão especial com a Ilha....
4 comentários:
É dificil achar alguem que não goste do gordinho.
Pena não ter sido bem aproveitado nessa última temporada, achei que ele ficou muito apagado.
Abraços
Ricardo Braga
Equipe ToonSeries
No meio de tantos bons personagens, ele se destaca como mais simpático com certeza.
Abraço
Parabéns pela análise. Eu gosto do Hurley. Acho que ele traz para "Lost" um elemento mais leve e que é necessário.
Olá pessoal!
Toon Series: Tbm acho... ele ficou mais coadjuvante mesmo nessa temporada, mas acredito que terá papel fundamental no final.
Hugo: Verdade... por ser um cara amigo de todo mundo, ele acaba agradando a gregos e troianos.
Kamila: Concordo! Hurley é o nosso alívio em tanta tragédia e momentos de tensão. Sem ele, o clima seria carregado demais.
Há braços
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