quinta-feira, 2 de julho de 2009

Dossiê Lost: Jack Shepherd

Texto de Karen Cristina

Jack Shepherd é um cara complexo. O bem sucedido cirurgião de coluna, tão centrado, comprometido e cético, tinha bases frágeis para suas certezas. E a transformação do Homem da Ciência que bateu de frente com a fé de Locke durante toda a série, em alguém vulnerável o suficiente para jogar fora todas as suas convicções e acreditar poder anular tudo o que ocorreu desde a queda do avião foi o bastante para humanizar o personagem.
Jack tem problemas com o pai. Como a maioria dos personagens, tem um relacionamento familiar conturbado. Mas entre todos, o seu conflito é o mais difícil de ser entendido, o mais sutil. Sob uma ótica superficial, é complicado entender seu drama. Jack não teve um pai tão repugnante como Kate e Locke. Não teve uma vida difícil como James, não foi abandonado como Hurley e Claire.

Jack se cobra a perfeição talvez por sentir a obrigação de corresponder as oportunidades que teve na vida. Com uma espécie de amor e ódio mixado e mal resolvido, ele passou a vida tentando impressionar o pai. Sem perceber que não precisava de tanto esforço, transformou o amor que tinha por ele em conflito, competição. Freud explica.

E como na vida, relacionamentos problemáticos com o pai (ou mãe) refletem-se em todos os outros de sua vida. Comprometido, ele não sabe desistir. O que pareceu por tanto tempo teimosia e arrogância é fruto de uma personalidade frágil e desesperada para consertar tudo.
Jack teve problemas de relacionamento com mulheres, o que é nítido na dificuldade de aproximação com Kate. Com a própria esposa, a paciente em quem reverteu uma paralisia irreversível - um resultado que deve ter assustado bastante o cético e racional médico - ele desenvolveu uma relação que desde o início não tinha chance de ser saudável. Parecia mais uma forma de se apegar ao que ele nunca entendeu.

Ao lado de Sarah, Jack tenta desesperadamente ter uma vida a dois. Mas nunca conseguiu se entregar emocionalmente. Guardou seus sentimentos, suas dúvidas e inquietações, se afastando de Sarah. E o mais triste: se submeteu ao papel de marido traído, tentando a todo custo manter um casamento falido.

O líder

Como todos os personagens, Jack chega à Ilha perdido em propósitos. Trazendo o corpo do pai, morto após uma séria desavença, a culpa o impele a ser líder. Mas não foi só a culpa. Jack assume na Ilha o papel para o qual se preparou durante toda a vida.

Não mais a sombra do pai, se sente na obrigação de cumprir as obrigações para as quais se sentira inevitavelmente ligado. Talvez sua desordem emocional seja uma artimanha de Jacob. Talvez seja apenas fruto da conturbada relação paterna.

É difícil não se irritar com Jack durante vários momentos. A intempestiva atitude de superioridade em relação a Locke, a teimosia, a pretensão de onipotência são difíceis de serem entendidas sem que se considere todo o seu passado emocional. Precisamos nos colocar no lugar de Jack. É preciso contextualizar o doutor...
Jack foi herói, não se nega. Assumiu a responsabilidade de liderança, tomou decisões, mesmo que erradas. Quando ninguém mais queria, ele se entregou ao papel de fazer o que era preciso em seu conceito.
Mesmo que sua imagem tenha se desgastado com o tempo entre os sobreviventes, ele teve a firmeza que sempre faltou a Locke. Não se preocupou em ser simpático. Preferiu fazer o que ele achava ser o certo.

Escolhas erradas – ou não, só no fim saberemos – Jack conseguiu o que o transformara no disco arranhado: saiu da Ilha. A felicidade durou pouco. Como fizera com Sarah, afastou Kate. Como o pai, se tornou um viciado.

Finalmente ele entende que tem que voltar. E mais uma vez o arrependimento o toma. Só que desta vez o sentimento não está mais enrustido. Jack chegou ao fundo do poço. Mas saiu de lá e foi a pessoa decisiva na volta dos Six para a Ilha.

Se transformando no Homem de Fé, ele se humanizou - não pela questão de ter Fé, não é esta a referência, mas em rever conceitos e se desprender do passado.
O propósito desta volta não parece ainda não muito claro. Se é realmente refazer a rota e impedir a queda, não sei. Mas não duvido mais que Jack tenha realmente um firme e fundamental propósito em estar onde está quando deixamos a Ilha – no fim da quinta temporada.
E tenho certeza de que no derradeiro suspiro de Lost, teremos Jack Shephard a embalar a despedida desta emblemática e marcante série.
Obs – É importante ressaltar a ótima atuação de Matthew Fox. Não tão badalado como Terry O´Quinn e Michael Emerson, Fox dá o tom exato ao personagem. Jack não seria Jack sem ele.

Pitaco do Paulo

Jack não é um líder, não queria sê-lo, mas as circunstâncias o levaram a assumir esse papel dentre os sobreviventes. Mas, de fato, ele nunca conseguiu ser o líder que todos esperavam, e sua insegurança sempre mostrou que ele é nada além de mais um ser humano, cheio de defeitos. Um homem que sequer tinha certezas sobre sua vida e que não estava pronto para assumir as verdades de um grupo. Será que ao assumir a missão do destino, ele pode, enfim, ser o protagonista de sua própria história?

7 comentários:

Teresa Diniz disse...

Bela análise do meu personagem favorito. Continuem assim.

Paulo Montanaro disse...

Obrigado pelo comentário, Teresa! Esperamos poder fazer um grande apanhado desse povo todo até o ínicio da última temporada.

Há braços

altieres bruno machado junior disse...

Olá paulo

Eu considero o Jack o personagem que eu mais gosto em Lost. Não que eu não goste dos outros, mas ele conseguiu se destacar na série. As vezes a gente apoia e concorda com tudo o que ele faz, já outras vezes a gente fica com raiva que dá vontade de mata-lo (rsrs). Isso que é interessante, não é um personagem perfeito: ele comete erros como todo mundo.
PS: agradeci e postei os selos que você me dedicou lá no Tomada 7. Mais uma vez, muito obrigado.

Abraços e até mais.

Paulo Montanaro disse...

Imagina, Altieres. É um prazer tê-lo como parceiro! E o Jack, bem... para um personagem que deveria ter morrido no meio do episódio piloto, como os produtores revelaram, até que tomou um rumo de extrema importância, né?

Há braços

KA disse...

Publiquei o Locke, parceiro!
E que venham as damas...
Bj

Luiz Salles disse...

Parabéns pelo Blog, Paulo!

Coloquei ele na sessão "meus blogs favoritos" do meu blog, pra eu dar uma olhada melhor, depois!

Mas eu ainda não assisti a última temporada de Lost, então, tô me blindando de "spoilers"... rs

Abraço!

Paulo Montanaro disse...

Olá pessoal!

Ka: Essa parceria está dando o que falar, hein!

Luiz: Opa.. já coloquei tbm o Pra Todo Mundo Ler na minha listinha de indicados. É um prazer essa parceria. E quando terminar de ver a temporada, volte para nos contar sua opinião, ok?

Há braços
Paulo

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